Meus Pesadelos com Falcão

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Meus Pesadelos com Falcão

Falcão Internacional

Eugenio Goussinsky

 

Toda criança tem um inimigo imaginário. Que, ao longo dos anos, vai se diluindo na mente, dentro de um desenvolvimento saudável. O meu era Paulo Roberto Falcão. Era muito mais uma hostilidade infantil do que uma inimizade.

 

Tudo por causa do estilo de jogo do craque catarinense. Era assustador ver aquele jogador alto, elegante, cabelos cacheados e loiros correr pelo gramado como se desfilasse.

 

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Temia, no meu íntimo, que toda aquela elegância ameaçasse o reino de Sócrates em meu universo. E desbancasse o meu ídolo como o melhor jogador em atividade na época.

 

 

Era um conflito para mim ver Falcão atuar de forma tão magnânima. E eficiente. Já vinha de algum tempo.

 

A primeira mostra foi contra o meu Corinthians, em 1976, antes de Sócrates estrear no clube paulista.

 

A presença de Falcão se impôs. De tal maneira que já me deu o primeiro grande susto como torcedor. Até me impediu de dormir tranquilo na noite depois da conquista do Brasileiro pelo Inter, com a vitória por 2 a 0.

 

Vivi uma sensação de pequenez diante daquela mistura de muralha e torre, vestida de vermelho, que dava uma combinação perfeita àquela imagem quase divina.

 

Na verdade, Falcão não era um vilão. Era como um super-herói que ameaçava a dinastia do meu. Uma espécie de Super-Homem desbancando o humano Batman.

 

Lembro que, em 1979, a partida que Falcão fez contra o Palmeiras, nas semifinais do Brasileiro, me deixou ainda mais atormentado.

 

O camisa 5 teve uma de suas maiores atuações pelo Inter, marcou dois gols e garantiu a vitória colorada por 3 a 2.

 

Ele chegou a dar bicicleta com a canhota. Fez gol de cabeça como um típico centroavante. E deu um fabuloso sem-pulo que terminou nas redes.

 

Na volta, o empate por 2 a 2 classificou para a final contra o Vasco, vencida pelo time gaúcho.

 

Sócrates também passava por fase esplêndida. Eu perguntava ao meu pai e a mim mesmo, como se falasse com o espelho da Branca de Neve: “Existe alguém melhor que o Doutor?” Eu temia ouvir, em qualquer sussurro, a palavra Falcão.

 

Falcão, Falcão, Falcão, que termo imponente para um jogador de futebol!

 

Como combinava com aquela majestade, com a classe, com o estilo insuperável de tocar a bola pelo alto, como se fosse um desenhista criando parábolas no gramado.

 

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Falcão e Sócrates ficaram amigos. Mesmo assim, mesmo comemorando como nunca o gol dele contra a Itália, na Copa, eu o via com receio.

 

Meu sobrinho Tcholo costuma dizer que todo super-herói tem sua fraqueza, mas há alguns que são especiais.

 

 

 

Vejo que eu, menino, vivia um processo de negação. O temor, claramente, era uma maneira de esconder a pura admiração.

 

Talvez até hoje eu não tenha entrado definitivamente no processo de amadurecimento. Pelo menos neste tema.

 

Ainda tremo diante das enquetes cruéis no Facebook, sobre quem era melhor, Sócrates ou Falcão. Dou sempre o meu voto fiel ao Doutor. Mas, confesso, fecho logo a tela. Prefiro não saber o resultado. E nem ouvir a resposta do espelho.

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