Quando menino, ele achava a brincadeira de esconde-esconde a mais emocionante. Sempre que a turma da rua, os primos ou seus amigos em uma festa se reunia, e ficava na dúvida sobre o que brincar, ele logo pendia para a sua preferida.
Não gostava da exposição competitiva do pega-pega. Preferia a estratégia, usando o ardil e a inteligência, de se encaixar nos becos mais impensáveis.
Preferia ser procurado do que procurar.
No vão da escada circular, contemplava a sala de outro ângulo. Estava isento de broncas dos adultos, de ser obrigado a ir cumprimentar as visitas, de querer se esconder dos outros sem ter onde ir. Naquele momento, podia.
Embaixo da mesa, coberta com uma longa toalha, a sensação de proteção era ainda maior. Não via nada.
Apenas intuía, com os passos apressados que resvalavam no tecido, o alarido ansioso das crianças, entremeado com as vozes adultas que tratavam de assuntos tão assustadores: política, rivalidades, discussões, altas gargalhadas, arrotando uma falsa sabedoria por aquele ambiente enfumaçado. Naquele momento, eles não o alcançavam.
Dentro do armário, então, a emoção era especial. Deixava uma frestinha para respirar e, quando estava escuro, podia ver alguns vultos correrem impotentes, inofensivos, sem aquela áurea de tudo saber, que as pessoas sempre tentavam ostentar.
Naquele momento, não sabiam onde ele estava. Admitiam, em parte, que não sabiam direito nem quem eram. De lá, rodeado pelo cheiro de naftalina e pelo suave toque da seda, ele respirava uma atmosfera de humanidade. De humildade.
E foi dentro do matagal do jardim que ele tomou importantes decisões. A noite era bela. Ouvia o alarido da festa e, com um gostinho de terra, olhou para cima e percebeu o brilho das estrelas. Sentiu-se contemplado por elas, daquelas distâncias, acenando-lhe de outros mundos, outras realidades.
Foi quando decidiu ser jornalista, para, com outras palavras, contar algo semelhante ao que as estrelas lhe contavam naquele momento. E fazer sucesso, ser o melhor passando uma mensagem de esperança, de que a grandiosidade humana não deve tentar ultrapassar sua pequenez diante do universo.
A brincadeira sempre tinha um fim. Devido à sua habilidade, costumava demorar um bom tempo. Suficiente para ele se recuperar de seus medos, da injustiça de alguns professores, da insensatez de alguns adultos, das brincadeiras sem graça na escola, das permanentes interrupções de seus sonhos.
Então uma cabeça surgia no vão da escada. A toalha da mesa era levantada. A porta do armário se abria. Alguém mais astuto se embrenhava no matagal, em meio ao cheiro de plantas. Ele sempre sorria, aliviado. Naquele momento, não precisava mais se esconder. O mundo, finalmente, estava tentando encontrá-lo.