Alguns dizem que a tecnologia poderá substituir os sentimentos humanos. Cada nova descoberta tende a carregar essa ideia, além, é verdade, de seus inúmeros benefícios práticos. Acontece que muitas definições virtuais não são reais. Compartilhar o quê? Depende.
Palavras como compartilhamento, integração, redes sociais muitas vezes não passam de retóricas. Escondem, no fundo, uma ilusão de onipotência.
Como a do torcedor de futebol, que ainda acha que tudo pode fazer em um estádio. Ou a do torcedor que se acomoda em dizer que é contra o racismo, apenas como slogan, mas não se aprofunda em suas ações.
Um símbolo disso é a enorme quantidade de mensagens por WhatsApp direcionadas a conhecidos, ou indicados por um interlocutor em comum, geralmente pessoas famosas ou requisitadas. Confundindo sentimento de invasão com vaidade, elas mantêm o curioso fenômeno de não enviar respostas.
São situações diferentes de mensagens recebidas de desconhecidos, de forma impessoal, como funcionários ofertando serviços. Neste caso, são conhecidos que não se veem há tempos; colegas de um passado em que ainda aspiravam pela fama ou indicados por alguém de confiança. Mas que, aparentemente, não interessam.
Não é a beleza do contato humano que guia grande parte das mensagens. Elas não têm paralelo com sorriso sem cobranças ou um aceno gratuito. Que, muito mais do que as descobertas tecnológicas, até hoje mantêm a humanidade em pé.
Não, essas trocas, mais do que um sincero bilhete de um estudante, parecem preenchidas de interesses mesquinhos, como mercadorias a serem vendidas em um entreposto comercial. “O que eu ganho em responder?”
Justamente nesse serviço de mensagens, o WhatsApp, criado a partir da necessidade de Jan Koum ser ouvido em suas aspirações por um mundo melhor. Ele é judeu e deixou a Ucrânia por causa do antissemitismo.
Criou a plataforma com uma pergunta que aguarda uma resposta corriqueira. Para que a comunicação flua. “What´s up”. “E aí?”
As conquistas tecnológicas atuais, com seus lados positivo e negativo, têm a facilidade de provocar em muitos uma sensação de poder. Do “eu virtual”: i-phone, i-pad… que, em vez de compartilhar e integrar, isola e tenta excluir.
Se não houver cuidado, pode-se pensar que, neste universo, as pessoas são virtuais. Pairam acima de regras de educação, cordialidade e empatia.
Nestes casos, esse tipo de mensagem em nada avança no tempo. Assemelha-se a uma mensagem na garrafa, enviada por náufragos ou perdidos no mar, em busca de uma palavra de esperança.
Ou às carta do romântico Proust para uma amada, enviadas por carruagem, sem viagem de volta no início do século 20.
Muitas mensagens atuais se perdem nas bucólicas trilhas de Paris ou no oceano de vaidades, interesses e egoísmo dos indivíduos.
Qual é o protocolo monárquico para essas mensagens? No caso de um contato com a rainha da Inglaterra, qualquer escorregão é uma gafe.
Seria assim para esse mundo do WhatsApp? “E aí?”. Silêncio total. Mas, mesmo no mundo virtual, até a rainha tem sentimento real.