Ninguém daria nada pela pança e a cara redonda. Ar de surfista aposentado. Cabelos loiros bem curtinhos. O apelido? Vanusa. Mas ele nem ligava. Fingia ficar bravo para depois soltar uma brincadeira. A verdade era que o playboyzinho não jogava nada.
Vivia no parque, com a camisa na mão, de bermuda e tênis sem meia. Conversava sem diferenciar grupinhos de garçons, pedreiros ou engenheiros.
Às vezes até fumava com os caras lá atrás das árvores. E quando saía já se enturmava no jogo. Campo de terra batida. Fincava-se lá no canto, tipo banheira, pedindo bola.
E o pior é que ela vinha. Ele chutava de canela. Cruzava torto. Acertava a orelha da menina, ela pegava um efeito estranho e saía.
Ele, então, olhava para o outro lado. Fazia cara de paisagem. Incrível era participar de todo jogo. Até a bola, tão maltratada, parecia gostar dele.
O cara vencia a grossura apenas com seu ritmo de maresia, na base do papo amigo.
Seus xingamentos eram bravatas, levantavam o pessoal, que continuava a passar a bola.
“Pô, vai se….” gritava, todo prosa, quando o passe vinha errado.
Jeito de moleque em corpo de cinquentão.
Não se envergonhava em dar de dedinho, de rosca ao contrário.
Furava, escorregava.
Continuava acionado.
E exalava seriedade antes do encontro desastrado.
Quando marcava gol, a festa e a gozação eram gerais, tamanha a raridade do feito.
Mas insistia. Resistia.
Acreditava e se divertia.
Quem jogava bem eram os outros.
O Negão, cheio de domínio de bola.
O Batuta e o seu drible mágico.
O Alê, esbanjando visão de campo.
Quase se profissionalizaram.
O time era supimpa.
Mas o centro da pelada era ele.
Ele se garantia.
Sempre se encaixava, cativando e integrando o espírito da brincadeira àquelas tardes sem fim.
Estando ou não empregado.
Feliz ou triste no amor.
Ele não tinha toques mágicos.
Faltava-lhe faro de gol.
Porém lhe sobrava a espontaneidade do futebol, que fazia daquele perna-de-pau o jogador preferido do parque.