Escritório

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Não sei se foi por causa de seu jeito simples. Ou pela necessidade da vida. Ele não se tornou cantor, como sonhava, mas contínuo. Era baixinho, de cabelos brancos e lisos, corpo atarracado e rosto com olhos e boca volumosos. Tinha a voz macia, como a de Cole Porter, a de Nat King Cole ou a de Bing Crosby.
Seu chefe, infernal, não parava de lhe dar broncas. Aos gritos. Ele não respondia.
Apenas saía da sala e ia cumprir as ordens, descendo as escadas cantando inúmeras composições estrangeiras decor, com letra e melodia.
Perto do Natal, entoou lindamente I´m dreaming of a White Christmas, após um surto no escritório.
Em outro pito, desceu cantarolando Let´s do it. O chefe havia gritado “Faça alguma coisa!” Outro dia, conheci a música Always, de Irving Berlin, pelo timbre aveludado do contínuo.
Os corredores pareciam camarins hollywoodianos, onde ele ensaiava. “Eu te amarei sempre…Com um amor que é verdadeiro sempre…” Agia com tranquilidade, quase mecanicamente. Na vez em que ele saiu da sala e iniciou a acelerada e frenética She loves you, dos Beatles, entendi um pouco mais daquela engrenagem que refreava sua cólera. O chefe havia urrado para ele ter pressa.

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