Futebol das Sete Faces

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Bola futebol

Eugenio Goussinsky

 

Jogos durante a semana, no sábado à noite, na terça, na quarta, quinta, segunda, sexta. Adoro.

 

Muito mais do que os de muitas tardes vazias de domingo, esses, considerados o “horário ideal”, o símbolo de uma suposta organização. E como fica a semana cheia de expectativas para as noites depois do trabalho?

 

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Mudo de canal. A mesa-redonda escancara um lado sádico, disfarçado de imparcialidade, que insiste em analisar jogadas interpretativas e lances mal resolvidos pelo VAR. São horas de ataques aos árbitros, um exercício prazeroso que dá audiência. Fico incomodado.

 

 

Acredito que dois centroavantes podem, sim, jogar juntos. Não concordo com teorias fechadas que decretam que tal esquema não serve para isso, ou que a posição fala mais alto que o talento. Caniggia e Batistuta. Klinsmann e Völler. Bebeto e Romário. Todos mostram que Yuri Alberto e Pedro poderiam dividir funções. Não renego duplas de ataque.

 

Sinto-me um idiota quando ouço opiniões que desmerecem os treinadores de seleções. Há uma submissão ao futebol europeu que exalta técnicos de clubes como incomparáveis e diminui o trabalho de Scaloni, Deschamps (vice-campeão da Champions com o Mônaco), Alfaro (já viram suas entrevistas?), Martínez, Luis de la Fuente, e tantos outros. O que há de errado comigo, que não vê assim? E agora, com Ancelotti?

 

Considero natural torcer pela seleção brasileira durante os jogos. Mais do que encenar uma isenção perversa, que no fundo se compraz com os reveses, porque eles alimentam o ego de quem neles apostou. E não, não me sinto um Pacheco.

 

Aprecio os Estaduais. Remete-me ao futebol raiz. Acredito que, mesmo com clubes afundados, ele foi importante para o fortalecimento de equipes como Ituano, Mirassol e Bragantino. Também não menosprezo títulos. Todos têm importância, que varia de acordo com o momento e as circunstâncias.

 

Sou contra a idealização irredutível de laterais como atacantes. Simpatizo com a ideia do lateral de pura técnica, cerebral, que arma, se posiciona mais atrás, dá o apoio com passadas elegantes, como as de Leandro, Júnior, Marcelo, Dida e hoje Danilo.

 

Gosto de ver pontas, e não defensores, como alas. Vibrei ao ver Guardiola colocar Robben e Ribéry nessa função. Da mesma forma, me empolgo quando técnicos ousam criar soluções a partir do talento e da iniciativa construtiva. Fico indignado com uma jogada desleal que é vista como algo corriqueiro.

 

 

Também me entristece ouvir a imprensa brincar com o radicalismo das rivalidades e, quando a violência explode, criticar de maneira fria, quase indiferente, apenas dizendo que “é inadequada”. Prefiro ver um corintiano respeitando o Palmeiras, capaz de reconhecer suas virtudes sem deixar de amar seu clube.

 

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A maioria das falhas dos goleiros, para mim, são falhas para quem está de fora e não pode sair do roteiro.

 

Os rótulos me machucam. A solidão me envolve toda vez que escuto um julgamento implacável, uma comparação cruel entre jogadores, uma depreciação de quem investe menos, um comentário irônico sobre a impossibilidade de vitória. Ou sobre a recuperação e volta por cima de um atleta. Recuso-me a ver jogadores como peças. Prefiro sempre acreditar na capacidade humana.

 

Ainda assim, escuto, assisto, acompanho. O futebol é minha paixão. Ele sempre me fez acreditar em alternativas. Ensinou-me a evitar chavões. Acho que seus movimentos imprevisíveis, seu aceno ao desafio da superação é maior do que os padrões de quem fala apenas por falar. A “marcação alta”, o “romper a linha”, o“pisar na área” a mim soam forçadas.

 

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Não, não me sinto presunçoso. Pelo contrário, um lado meu me acusa de desatino. Um dia, li o Poema das Sete Faces, de Carlos Drummond de Andrade. Gostei da ordem do anjo torto, que, neste contexto, nunca seria jogador.

 

“Vai ser gauche na vida.” Eu obedeci. Fui. Mas como jornalista.

 

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